O Futuro dos Hedge Funds Imobiliários: Evolução ou Substituição dos FOFs?

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Em um cenário de recuperação do mercado de fundos imobiliários, com o IFIX acumulando mais de 6% de alta no ano após um segundo semestre desafiador em 2024.

Duas classes de ativos se destacaram particularmente: os Fundos de Fundos (FOFs), com valorização de 3,8% em fevereiro, e os Hedge Funds Imobiliários (Head Funds), que registraram um impressionante aumento de 7,2% no mesmo período.

Este desempenho superior dos Head Funds tem gerado debates sobre se estes veículos representam uma evolução natural que eventualmente substituirá os FOFs ou se ambos continuarão coexistindo, atendendo a diferentes perfis de investidores.

A Transformação do Mercado de Fundos Imobiliários

Os Hedge Funds Imobiliários surgiram como resposta às limitações estruturais dos FOFs tradicionais e à crescente demanda dos investidores por soluções mais completas. Enquanto os FOFs se restringem a investir em outros fundos imobiliários e, em alguns casos, em Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), os Head Funds possuem mandatos significativamente mais amplos que permitem:

  • Investir em múltiplas classes de ativos com lastro imobiliário
  • Alocar recursos com maior flexibilidade, adaptando-se ao ciclo econômico
  • Combinar estratégias de investimento em CRIs, fundos imobiliários, ações do setor e imóveis físicos
  • Implementar estratégias mais ativas de rotação de portfólio e realização de ganhos
  • Integrar visões multidisciplinares na gestão dos ativos

Esta evolução nasce principalmente da percepção dos próprios investidores que muitas vezes se sentiam confusos sobre qual produto específico escolher em diferentes momentos do mercado. Como explicado por um gestor de um Head Fund: “A gente ia lá e fazia pitch de vendas: olha, agora vamos fazer um fundo de CRI, agora é um fundo de CRI indexado à inflação, agora é um de CDI… E tinha muito investidor falando: ‘Eu entendi todo o pitch de vocês, mas eu não sei exatamente o que que eu compro agora, que hora que eu tenho que trocar'”.

O “Paradoxo dos FOFs” e as Vantagens Estruturais dos Head Funds

Uma das análises mais interessantes sobre os FOFs tradicionais revela um paradoxo intrínseco ao seu funcionamento: quando o mercado está em alta, eles distribuem bons rendimentos, realizam ganhos de capital e fazem novas emissões, mas acabam comprando ativos progressivamente mais caros com o capital captado. Quando o mercado reverte e inicia um ciclo de queda, esses fundos ficam com prejuízos contábeis acumulados e, devido às regras de distribuição de rendimentos, têm dificuldade para gerar valor durante períodos de baixa.

Os Head Funds foram projetados para superar essas limitações através de:

  1. Comitês de investimento multidisciplinares: Reúnem especialistas em diferentes áreas (CRIs, fundos imobiliários, ações, análise macroeconômica) para uma visão integrada
  2. Mandatos mais amplos: Permitem diversificação não apenas entre fundos, mas também entre classes de ativos imobiliários
  3. Capacidade de incorporar diferentes visões macroeconômicas: Podem ajustar a alocação com base em cenários de juros, inflação e crescimento econômico
  4. Possibilidade de investimentos diretos: Podem acessar imóveis físicos, participar de desenvolvimentos e estruturar operações customizadas
  5. Gestão focada em retorno total: Equilibram distribuição de rendimentos com preservação e crescimento do capital

Como descrito por um gestor: “É um fundo que ele mira ainda entregar uma renda recorrente boa pro investidor, mas que a escolha do portfólio está na mão dos gestores.” Esta abordagem oferece uma terceirização mais completa das decisões de investimento, permitindo que o gestor adapte a estratégia conforme as condições de mercado.

Coexistência ou Substituição? O Debate sobre o Futuro

Apesar das vantagens estruturais dos Head Funds, a opinião entre os especialistas é de que ambos os veículos devem coexistir, pelo menos no médio prazo, por diversas razões:

Argumentos para a Coexistência:

  1. Duplo Desconto dos FOFs: Em momentos de estresse de mercado, os FOFs apresentam a vantagem do “duplo desconto” (desconto sobre o valor patrimonial dos fundos da carteira, mais o desconto do próprio FOF), criando oportunidades atrativas
  2. Potencial de Recuperação: “Na hora que volta, ele é muito potente”, afirma um gestor sobre os FOFs em períodos de recuperação de mercado
  3. Preferências de Controle: Alguns investidores preferem manter maior controle sobre sua alocação entre diferentes classes de ativos, optando por fundos especializados
  4. Escala e Liquidez: FOFs maiores e mais estabelecidos contam com escala e liquidez que os tornam veículos relevantes mesmo com limitações

Argumentos para a Substituição Gradual:

  1. Evolução Natural: “Eu acho que os Red Funds serão o futuro do FOF. Os FOFs vão buscar essa tese”, argumenta um especialista
  2. Consolidação de Produtos: O movimento de fusão entre FOFs e Head Funds da mesma gestora já começou, como no caso citado do BCF com BTHF
  3. Simplificação para o Investidor: A tendência de simplificação favorece produtos mais completos e abrangentes
  4. Vantagem Competitiva: Gestoras com equipes multidisciplinares têm vantagem na estruturação de Head Funds eficientes

Desafios para a Consolidação dos Head Funds

Para que os Head Funds se estabeleçam definitivamente como uma evolução dos FOFs, vários desafios significativos precisam ser superados:

1. Histórico Limitado

Como veículos relativamente novos (a maioria surgiu após a pandemia), os Head Funds ainda não passaram por ciclos completos de mercado. Um especialista observa: “A gente ainda tem uma massa crítica muito pequena de histórico e como os primeiros Head Funds surgiram agora depois da pandemia, então o histórico não é muito interessante”.

2. Restrições Regulatórias Persistentes

Os Head Funds continuam sujeitos a algumas das mesmas regras que limitam os FOFs: “A premissa básica de você distribuir com prejuízo, se você vende com prejuízo impacta o rendimento, ela vale pro Red Fund também”.

3. Necessidade de Diferenciação Real

Para justificar sua existência, os Head Funds precisam oferecer estratégias verdadeiramente diferenciais: “Pro Red Fund realmente conseguir ser anticíclico, ele vai ter que buscar ou uma exposição muito grande em CRIs, ou ir no caminho de trazer imóvel, desenvolvimento, tentar buscar teses muito diferentes”. Um especialista alerta que fundos que fizerem apenas o “arrozinho com feijão” não conseguirão se diferenciar o suficiente.

4. Adaptação dos Investidores

Será necessário ajustar as expectativas dos investidores quanto ao perfil de distribuição dos Head Funds: “O investidor vai ter que ter o Red Fund na carteira dele com uma caixinha bem diferente. Talvez aceitar um yield menor para colher muito mais ali na frente”.

5. Estruturação de Equipes Multidisciplinares

A gestão eficiente de Head Funds exige equipes com especialistas em diferentes áreas do mercado imobiliário: “É o primeiro fundo que eu tenho quatro sócios participando da gestão, porque essa foi o espírito”.

Tendências e Perspectivas Futuras

O mercado de fundos imobiliários como um todo deve continuar crescendo e se consolidando como parte essencial da alocação tanto de pequenos investidores quanto de grandes patrimônios familiares. As principais tendências apontadas incluem:

1. Maior Diversificação Setorial

“Acho que ainda falta mais fatores de diversificação. Então, acho que tá faltando lá ter, sei lá, residencial maior, data center maior”, observa um gestor, indicando a necessidade de expansão para novos segmentos imobiliários.

2. Consolidação de Produtos e Gestoras

O processo de consolidação é visto como “um caminho sem volta”, abrangendo gestoras, produtos e teses de investimento. Um especialista sugere inclusive a possibilidade de consolidar FOFs, Head Funds e fundos de CRIs da mesma gestora.

3. Simplificação para o Investidor Final

A tendência é de simplificação das carteiras: “No passado a gente falava de carteiras com 30, 40 fundos. Hoje a gente fala com carteiras de 15, 20 fundos. E quem sabe um dia a gente esteja falando de carteiras com 5, 10 fundos”.

4. Evolução da Qualidade de Gestão

O crescimento do mercado deve ser acompanhado por “uma nova rodada de afunilamento de qualidade de gestores, ativos e portfólios”, elevando o nível de sofisticação do setor.

5. Necessidade de Juros Mais Comportados

Para que o mercado experimente todo seu potencial de crescimento, “a gente precisa de um pouco de juro um pouquinho mais comportado aqui para as pessoas experimentarem”.

Considerações Finais

O debate sobre o futuro dos Hedge Funds Imobiliários versus FOFs tradicionais reflete um momento de transformação e amadurecimento do mercado de fundos imobiliários brasileiro. Enquanto os Head Funds representam uma evolução natural que expande as possibilidades de gestão e diversificação, os FOFs continuam oferecendo vantagens específicas, especialmente em momentos de estresse e recuperação de mercado.

A expectativa é que, mesmo com a gradual migração para veículos mais sofisticados, ambos continuem a coexistir no médio prazo, atendendo a diferentes perfis e objetivos de investidores. No longo prazo, porém, a tendência de consolidação e simplificação provavelmente favorecerá modelos mais abrangentes e flexíveis, com os Head Funds ocupando um espaço cada vez mais relevante nas carteiras de investimentos.

Como em qualquer evolução de mercado, o sucesso dos Head Funds dependerá não apenas de sua proposta conceitual, mas da capacidade dos gestores de efetivamente entregar resultados superiores e consistentes ao longo de diferentes ciclos econômicos. Como resumiu um especialista: “É algo que o tempo vai dizer”.

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